93. Esta 6 por certo a terra que buscaes
Da verdadeira India, que apparece;
E, se do mundo mais näo desejaes,
Vosso trabalho longo aqui fenece.«
Soffrer aqui näo pode Gama mais,
De ledo ein ver que a terra se conhece;
Os giolhos no chäo, as mäos ao cöu,
A merce grande a Deus agradeceu.
94. As gragas a Deus dava e razäo tinha,
Que näo sömente a terra lhes mostrava,
Que com tanto temor buscando vinha,
Por quem tanto trabalho exprimentava;
Mas via-se livrado täo asinha
Da morte, que no mar lhe apparelhava
O vento duro, fervido e medonho,
Como quem despertou de horrendo sonho.
95. Por meio d’estes horridos perigos,
D’estes trabalhos graves, e temores,
Alcangam os que säo de fama amigos,
As honras immortaes, e gräos maiores:
Näo encostados sempre nos antigos
Troncos n obres dos seus antecessores,
Näo nos leitos dourados entre os finos
Animaes de Moscovia zebellinos:
96. Näo co’os manjares novos e exquisitos,
Näo co’os passeios molles e ociosos,
Näo co’os varios deleites e infinitos,
Que afeminam os peitos generöses;
Näo co’os nunca vencidos appetitos,
Que a fortuna tem sempre täo mimosos,
Que näo soffre a nenhum, que o passo müde
Para alguma obra heroica de virtude:
97. Mas com buscar co’o seu forgoso brago
As honras, que eile chame proprias suas,
Vigiando, e vestindo o forjado ago,
Soffrendo tempestades, e ondas cruas,
Vencendo os torpes frios no reg;:co
Do Sul, e regiöes de abrigo nuas,
Engolindo o corrupto mantimento,
Temperado c’um arduo soffrimento: