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mente ja se ve, as victimas do destino. E, talvez, devido a esta corrente
de desanimo, a este influxo pernicioso de aspiragöes insaciaveis e
irrealisaveis, que vultos eminentes da esphera intellectual de Anthero,
de Camillo, de Filippe Simöes, de Julio Cesar Machado, de Soares dos
Reis, de Mousinho de Albuquerque, puzeram termo fatal a sua existencia
mais convulsionada pelos sentimentos communicados externamente do
que pelos internos soffrimentos proprios.
Em compensagäo, alguma cousa extremamente consoladora vem
dissipar o negrume das trevas, fazendo realgar apenas a face luminosa
da medalha. O portuguez, longe do seu bergo natal, € quando professa
mais vivo o amor pela sua patria. E a saudade quem lhe estimula
este sentimento, quem lhe dä esta miragem deliciosa, quem lhe accende
o fanatismo bendito pela terra que lhe deu o ser. O portuguez con-
testa do modo mais solemne o proverbio que diz: »Longe da vista,
longe do coragäo.« Elle, pelo contrario, quanto maior 6 a distancia
que o separa do seu bergo querido tanto maior 6 o affecto que lhe
consagra. Nos sertöes mais inhospitos, nas mais remotas paragens, o
portuguez näo se esquece de sua origem, da sua procedencia, balbu-
ciando sempre o nome de mäe e näo o de madrasta, embora a sua
infancia e a sua mocidade näo decorressem sempre alegres no solo
que diversas circumstancias o obrigaram a abandonar.
Na grande Republica do Norte da America, os nossos irmäos,
quasi todos agoreanos, näo se deixam absorver facilmente pela poderosa
nacionalidade e näo se envergonham de fazer parte de um pequenino
paiz. E porem na America do Sul, na florescente Republica brasileira,
que se desenrola mais assombroso o espectaculo do patriotismo portuguez.
0 ambiente tambem 6 mais favoravel, ,por isso que säo da maior in-
timidade as relagöes entre os nossos compatriotas e os subditos
brasileiros.
Somos da mesma raga e formamos uma unica familia, diluidas
as rivalidades que podessem advir do antigo dominio. A prova 6 v£r
como os brasileiros estäo erigindo estatuas e consagrando apotheoses
aos mais notaveis vultos dos tempos coloniaes, que tanto concorreram
para langar as bases da futura nagäo brasileira cuja autonomia era
facil de prever. O proprio 1). Joäo VI recebe dos republicanos o preito
que lhe e devido pela parte com que, mais o menos impulsivamente,
contribuiu ä liberdade do commercio brasileiro, independencia econo-
mica, de que fatalmente resultaria a independencia politica.
As alegrias e as dores da patria reflectem-se com enthusiasmo
ou com enternecimento na colonia portugueza do Brasil, que se julga
solidaria dos nossos destinos. Apraz-nos ver esta communidade de
idbas, esta propagagäo de sentimentos, e se b justificado o nosso or-
gulho por este motivo, näo menos indelevel deve ser o nosso reco-
nhecimento, pois vamos encontrar ali um apoio moral, que nos dä forgas
para resistir a todas as attribulagöes da existencia. O que nös dese-
jariamos 6 que essa vasta familia contemplasse sempre a imagem da
Patria sob um unico aspecto, n’um conjunto harmonioso, n’uma
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