da pedra ou do madeiro, onde as delineia e arredonda o seu buril.
S<5 a palavra, mais inventiva do que Zeuxis, sabe desenhar e colorir
figuras e paizes, com que se iilude e engana a vista intellectual.
So a palavra mais audaz do que os Ictinos e os Cal ii erat cs, traga,
dispöe, exorna e arremessa aos ares monumentos mais nobres e ideaes
que o Parthenon de Athenas. S6 a palavra, mais commovedora e
persuasiva do que o plectro dos Orpheus, encadeia ä sua lyra magica
estas feras humanas ou deshumanas, que se chamam homens, arrebatados
e enfureeidos nas mais truculentas allucinacöes.
y. M. Latino Coelho
(1825—1891).
34. Retemperemos a raca!
Um dos episodios mais beilos da formidavel epopea de Zola
La Debacle b aquella scena do lavrador, que, n’um escondido valle
do campo de Sedan, longe dos perigos da batalha e ao abrigo das
balas, continua pacificamente a sua tabuta. E um pequeno mundo de
paz e de trabalho. Lä em cima lucta-se com ferocidade e milhares de
homens mordem o pö da terra, varejados pela metralha. Ha gritos de
dör, uivos de desespero das tropas massacradas. As culturas estäo
perdidas. As labaredas lambem aldeias inteiras, n’um crepitar sinistro
e macabro. Sedan, o ultimo refugio do faustoso Napoleäo, estä sitiada,
envolta no circulo de ago dos canhöes prussianos. E no meio de tanta
miseria e desespero a vida continua risonha n’aquelle perdido valle,
em que pacificamente o lavrador trabalha a terra, indifferente ao motim
e ao canhoneio violento, que tanta mocidade e tantas illusöes estä
ceifando bem perto! Em freute d’um mundo de dor, um mundo de
esperanga, simplista e pacifico: b assim e foi sempre assim a existencia
humana . . .
Os tristes acontecimentos näo nos devem, portanto, impedir de
que continuemos una lucta pelo eugrandecimento da patria, cheios da
mesma fb pelo seu futuro.
E o futuro depende da forma como encararmos e resolvermos
o problema da educagäo populär e soubermos pör em pratica os con-
hecimentos adquiridos nas crises nacionaes e os sentimentos altruistas,
que em cada coragäo se albergam.
Da-se entre nös um caso digno de reparo. Poucos povos haverä
de tendencias mais caritativas do que o nosso. Estas nobres qualidades
teem, comtudo, o defeito do excesso e da falta de. originalidade, que
atb aqui caracterisa a raga portugueza. Mal comprehendemos que em
materia de assistencia e educagäo social, lä fora se estäo rasgando
horisontes novos.
Estamos ainda na phase heroica: a nossa caridade remedeia,
mas näo previne. As dadivas dos generosos e as herattgas dos argentarios
continuam a canalisar-se para o mesmo mar morto .. .